quinta-feira, 24 de abril de 2025

O Avesso do Ser


Se sei fazer melhor, não sei.

Talvez, se ousasse ser o que sou,

e compreendesse o profundo sentido do sentir,

se outras portas de mim se abrissem,

voando para além da anilada cúpula

que sustento e que pesa tanto, de infinitude, em luzes e sóis,

e me soltasse das raízes cada vez mais profundas, por sede,

nascidas dos passos de outros,

que inibem esta figura da autenticidade,

e atravessasse o espelho, marcado por tantas águas,

para que, do avesso, me olhasse

e te visse como já fui,

soubesse.

 

Todo animal, morre durante o caminho,

quando o fim está na pressa de chegar a um lugar onde nunca esteve,

e deseja tão somente agradar quem diz que ama e aceita,

sem que se ame, se aceite, se seja, se viva.

 

Só me debruçarei sobre a paisagem

para sentir o que lá há,

depois de me esgotar no que vim e faço.

 

Se houver alguém que repouse na tranquilidade dos dias,

é unicamente fogo-fátuo.

 

Por muito que se queira saber,

nunca se sabe, o que se sabe.

Qualquer pretensão tem maior carrego em outro lado

e divino é quem não crê para se salvar,

e terreno é imaginar-se deus para se redimir à sua condição.

 

Se sei fazer melhor, não sei.

Faço o que sei para o que serei,

sem nunca ser o que desejo ser.

 

A barca navega em mim, timoneiro é o Tempo.

Nunca é tarde antes de anoitecer.

 

 

 

 João Marques Jacinto

 

 

 

 

 

 

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