I
Tenho medo do escuro das pessoas,
mesmo vistas à luz.
II
Acredito nas palavras convictamente ditas com emoção;
enfeitiça-me o sedutor,
e logo se quebram sonhos
pelo chão.
III
Escondo-me de verdades moralistas,
que se definem e regem,
tenebrosamente magoam,
dilacerando-me,
das vísceras à alma,
o vínculo
dos sentidos à vida.
IV
Nunca, por querer, fingi ser outro(s),
que não eu.
V
Reina na selva o predador;
perseguem-me os uivos das lembranças
e os ventos da tempestuosa saudade,
as dores das perdas, as mortes,
a raiva por derrotas amaldiçoadas,
e o grito repreensor,
que me amordaça a mente
e a voz.
VI
Farei de tudo,
para ser um pouco mais do que sou,
renegando a brutalidade das trevas,
sublimando o desejo
e vasculhando o prazer
abençoado pelo amor.
VII
Pesa-me o fardo do sofrimento,
a mó do empobrecido encanto,
o tempo das passadas no deserto,
e a inquietação por um oásis sob estrelas.
VIII
Sinto a pena abstrata da humilhação,
sinto-me só, vazio de ambição e de egoísmo,
à beira da perdição, por um abismo,
desvairadamente louco,
sem bonança
e gloriosos deuses que cumpram.
IX
Instintivamente arrumo-me ao que sei,
luto em clandestina resistência,
para que me vença,
caminho para melhor fim desde o início,
busco o êxtase pelo que me é devido,
e hei-de ser o que me imaginei ao futuro,
até que meu corpo serenamente entardeça.
(2003)
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