Vinde, partes dispersas de mim,
vinde dos abismos onde vos escondestes,
das luzes que não suportaram o vosso brilho,
das sombras que vos moldaram em silêncio.
Vinde, fragmentos que amaram sozinhos,
vinde memórias que nunca aconteceram,
possibilidades que se perderam ao nascer,
eus que não couberam no tempo,
eus que falharam e, mesmo assim, deixaram semente.
Eu vos convoco.
Não para julgar,
mas para reunir.
Porque sou mais do que o agora que me veste.
Sou intenção antes do gesto,
eco antes da voz,
universo antes da forma.
E quero ser inteiro —
não para ser imune,
mas para ser música.
Quero vibrar com a sabedoria do Todo
como uma harpa toca o sopro,
sem saber de onde vem o vento
mas conhecendo-lhe a direção pelo som.
Unam-se em mim,
ó vontades contraditórias,
ó medos antigos,
ó desejos que ainda ardem sob o gelo.
Unam-se não para serem vencidos,
mas para serem transfigurados.
Não quero perder parte alguma.
Quero dar lugar.
Quero construir-me não pelo corte,
mas pela integração.
Cada erro é um degrau,
cada erro é um dente da engrenagem
que move o relógio cósmico de mim mesmo.
E se ainda não coincido com a vibração do Todo,
que ao menos me afine a escuta.
Que sinta o frémito, a pulsação que me chama,
como quem reconhece o sangue
no som distante de um tambor.
Serei inteiro.
Não por medida,
mas por presença.
Serei uno,
não pela forma,
mas pela dança.
Serei eterno,
não por duração,
mas por ressonância.
E quando finalmente vibrar
no tom exato da Inteligência que me gerou,
então o universo
saberá que em mim
se reencontrou.
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