domingo, 25 de dezembro de 2011

Em vésperas de Natal

Foram muitos,
também crianças,
os que partiram de comboio,
naquele rigoroso inverno,
em vésperas de Natal,
com uma estrela cosida na roupa,
em direcção, não ao Pólo Norte
onde reside São Nicolau,
mas a Auschwitz-Birkenau.
Foram muitos
os que chegaram,
mas alguns não o viveram,
sem entender por quê.
Ainda hoje, me custa crer
que haja viagens com esses destinos,
seja ou não Natal,
que tenha acontecido ontem
e tudo já esteja imémore.

sexta-feira, 23 de dezembro de 2011

Os destinos do Homem e D`Eus

Um dos arquétipos, que nos habita é Jesus
(o do Filho do Pai e/ou Grande Pai).
E fomos desde sempre estimulados a sê-Lo nas boas acções
e reprimidos a contrariá-Lo na autoridade moral
com que pôs em causa a Lei dos homens
e os servos do(s) Templo(s).
E tudo o que fez foi por AMOR
e nós!

Haja frátria capaz de se (re)fundar
e implantar o regime jesusista,
e espalhá-lo, de acordo com a palavra do Mestre,
para que renasça a Igreja da Humanidade
e se cumpram os destinos do Homem e D`Eus.

Revelação

Paro.
Paro e escuto-me atentamente.
E traduzo por palavras,
o que em mim estava adormecido,
desde as profundezas dos tempos,
e que por entre tantos afazeres
que me justificassem
e me confundiam,
julgava perdido,
tudo o que sinto.
E declamo em voz alta
os versos que me nascem do infinito,
para que me ouça, convicto,
e saiba definitivamente quem sou,
e procure com correcção
vestir este caminho,
que sai tão lentamente do nevoeiro,
e me estava desenhado há muito.
E assim entender melhor
o sentido da existência,
e percorrê-lo coerentemente,
com firmeza,
a cada passada pelas conquistas,
ao lado, também, de quem ainda
precisa que lhe dêem as mãos,
e não teve coragem de parar
e de se ouvir com atenção,
nem de se perdoar.
Paro
para que me chegue o tempo,
à revelação.
Paro,
e acredito-me,
para que me cumpra
no fado,
que afinal, não é só meu,
para que também seja,
e por bem,
de todos.

Suspiros

Tudo está em mim.
E assim, sou reflexo do céu.
E o espelho deve estar em consonância com a imagem.
E por cada suspiro que dou,
há uma estrela que aumenta a intensidade de seu brilho.
E mesmo que queira,
nem sempre há brilho suficiente, numa qualquer estrela,
que me leve a ter uma respiração anelante.
E nem sempre nos meus suspiros
há verdade capaz de provocar movimento
seja ao que for.

E continuo observando o céu, em mim,
e o firmamento onde me perco,
à espera de qualquer entendimento
que justifique este sincronismo,
para além desta realidade.

Berço de poesia

É por entre estas paredes
onde escrevo o que me digo,
que habito nas horas mortas
e me refugio em silêncio,
das exigentes rotinas de vencedores,
das expectativas a viris respostas,
do confronto em esforço com a dúvida,
da carência de quem mal se conhece...
Fecho-me neste berço de poesia,
onde atentamente tudo em mim observo,
rendido ao incentivo da procura,
na solidão que me conforta ao (re)encontro
do que fui, desde sempre,
e não me lembro,
até onde, por fim me completarei,
mesmo que esteja, longe desse entendimento,
em misterioso labirinto.
Estimulado, pelo desejo de liberdade,
a vencer-me no preconceito,
a lutar contra todos os medos do medo,
e a provocar a escrita ao movimento,
e a protegê-la de maus olhares...
Para que em brincadeiras de palavras
me construa à vontade, nos degraus
do que me eleva,
e provoca emoções
e me dá sentido...
E haja quem me queira
tão somente
pelas palavras,
e se sirva de minhas palavras,
se delas souberem mais de si
e de como brincar,
assim comigo,
para que se seja poesia,
para além de qualquer palavra,
e mais do que poeta.

Mesmo como poeta

Tudo é um mistério,
até ao que me proponho,
sem nunca perceber bem a razão
do que ao certo me motiva
e me impulsiona
a esta constante procura
e mutação.
Os versos são como rios
difíceis de trancar
dentro da nascente,
de todas as recordações.
E pesado é o mundo
que carrego,
sem nunca entender,
se é mal
ou bênção.

Mas, valha-me o amor,
por que só nele
me acredito
e conduzo,
mesmo como poeta,
esperando que a vida se escreva
mesmo de poucos cantos,
mas belíssimos,
em poesia.

Não poderemos morrer

Como pode o mal (ou o bem) de alguns
prejudicar muitos,
e haver tanto fanatismo
e solidariedade
por quem tão orgulhosamente
corrói
e tanto desprezo tem
por quem sem defesas sofre
e tristemente se perde?

Onde mora o homem de género;
capaz, de fazer nascer o futuro
e do amor que justifique sua grandeza?

Entre tanta pobreza
haverá quem, certamente,
esteja bem acordado
e pleno de sabedoria,
pronto para marchar
e a emergir do silêncio...

Não poderemos morrer
de inércia,
esvaídos de memórias.

Não poderemos morrer.

Minha pequena horta

Trabalho com deleite
esta terra
que me sustenta.
Semeio cuidadosamente
e com preceito,
cada grão de vida,
que se fará luxuriantemente verde
e assim é desejado,
e se sobreporá,
pelo caminho da luz,
crescendo até aos limites de si,
ao castanho que me dá chão,
e sinto quando piso,
e cheiro quando lavro,
e me suporta e me prende
quando me evado sem mim...
E faço humildemente
da minha pequena horta
o orgulho do mundo,
para que o sacrifício da morte,
dê ao meu labor
um sentido maior,
e me recompense
da culpa,
e do poder
e de outras anomalias.

Solidão

Sentir-me aqui,
nos confins do universo,
limitado a este pequeno mundo,
onde nem tudo
o que conheço desgosto,
e o que me é esquisito, atrai,
à espera que me descubram,
e me salvem,
sem certezas de futuro
e de haver alguma ponte,
dá-me angústia,
aumenta-me a solidão.

Crio esperanças,
invento crenças
e imagino-me como eleito,
e assim me compenso da pequenez
e ao medo do fim.

Não Te entendo,
e nada sei de Ti
mas muito provavelmente
sabes que existo.
E assim jogamos;
perdendo-Te sempre,
talvez para que, um dia,
Te aprenda...

Um

Estou cansado
de ser só um
e um.
Quero ser
mais de um
e mais um.
E apenas um
para descansar.

Início

Início
é referência,
caminho
é união,
fim
é propósito
e (re)início.
E inteligência
é tudo.

Outra vida

Dei-me outra vida,
entregando-me
entre braços da noite
ao que intensamente
me foi sonho,
e como eternidade
senti...

Quando acordei
logo ali, morri,
para que continue esta,
aqui
e agora,
motivada
por outros sonhos
que nem sempre
são realidade.

E teimo
em me querer de sonhos
sem primeiro me crer
e me sonhar.

Caminho

A vida corre
depressa de mais,
para que não só faça
o que me dá prazer,
mas também o que me é devido.

Nem sempre
entendo
este caminho
de ser,
a não ser
quando o sou,
caminhando-o.

Não sei o hoje

Não sei o hoje.
Ainda agora nasceu.
Mas tão longe irão a horas
depois de bem alto ir o dia,
que de tarde será tão tarde,
até que finde a tristeza
depois de se pôr o passado,
e haja uma noite curta
entre o longo hoje,
e o esperançoso amanhã.

Não sei o hoje,
temo o que ainda não sei,
mas creio no (re)início.

O sonho

O sonho
é maior que eu,
para que me imponha
a não vivê-lo.
Mesmo que me (des)iluda,
não me resignarei
à força da gravidade,
à cristalização...

O sonho
leva-me ao melhor de mim.

Sem me mentir

Perdi já tempo
a querer mostrar
o que não sou,
quando valho mais
do que pareço
e esperam de mim.

Esta coisa
do invólucro
só deverá reflectir
a totalidade
da essência,
sem fazer batota,
me mentir.

Veneno

Cura-se veneno
com veneno.
Para veneno,
veneno e meio
(em pequenas doses);
não sendo adepto
desta mesinha.

Quanto mais se envenena
mais se contamina,
até se morrer
de infelicidade,
e só.

O silêncio
é o antídoto
que melhor neutraliza
o veneno da culpa.

Estou imune
ao desamor
e à pobreza.

Espero
às portas da vingança,
para perdoar.

Fujo

Fujo,
não para esquecer,
mas para alcançar
liberdade.
Solto os animais
que me habitam
e apodera-se-me
outra coragem,
e luto com a sombra,
para desventrar,
no mais profundo dos mistérios
da existência,
as entranhas do infinito,
até à soberana consciência
do todo, em mim.

Fujo,
por que (pres)sinto,
o inimaginável,
sem o conseguir decifrar.
E lucidamente
confundo-me
com a loucura
e a insatisfação.

É difícil
crer
e ser terreno,
ser deus
e também carne,
amar
e sobreviver.

Fujo,
com esperança,
que algum dia
me encontre.

Estes

Estes,
que outrora foram os revoltosos,
são agora os resignados,
vendidos ao poder,
limitados pelo que usufruem,
presos nas teias
que entre si teceram,
esquecidos dos ideais ...
Esperando que outros surjam
por entre seus pesadelos,
e se aproveitem de suas fraquezas,
e façam, agora a mudança,
convencidos de verdades,
lúcidos de sua classe,
conscientes da grandeza do todo...
E os soltem , sem quererem,
de seus fantasmas
e de malévolas ambições.

E livres estarão
de nunca apenas,
se pertencerem
e de que não lhes roubem
o amor.

Dois senhores

Aquele que reconhece,
com fanatismo
quem faustosamente
diz ser representante
de Cristo na Terra,
nada sabe de Jesus,
não é um bom cristão,
nem um bom homem.

Neste circo da existência;
somos amestrados
pelas armas do medo,
submissos à sombra,
presos à insignificância,
incapazes de transcender as crenças
e de tocar com liberdade
o divino.

Não se pode servir
a dois senhores...

Aprenderei

Aprenderei
o necessário,
para que me entendam
em todos os lugares
e assim também possa
decifrar o sentido
de todas as palavras
que me sejam declaradas
com amor,
e que advenham de Ti.

Mas Contigo
falarei apenas,
na língua de minha alma,
para que me ouça
e Te (pres)sinta
daqui, onde (re)nasci
e me (re)fiz,
em português,
até ao infinito
de todos nós,
sem que, o tempo
nos conte
e a noite
nos caia,
mesmo que sejam
breves as emoções.

Vinga o animal

Muito do que escrevo
não passa de lamechices de um homem simples
que teima em chamar por Ele,
indignado com tanta (in)justiça,
incluindo a do Arquitecto.
Como puderam os homens inventar a culpa
sobre uma única mulher
(e marginalizarem as restantes)
e fazerem d`Ele seus cúmplice?
E persiste a inverdade das minorias
para garantir o poder sobre os demais.
Mais do que a razão, vinda o animal.

O país da dignidade

Apagam-se memórias,
despreza-se gente,
corrompe-se a esperança,
desertifica-se o hoje,
decreta-se o incumprível,
persiste-se ao caos...

O que dirá de nós
o futuro
e onde será o país
da dignidade,
para quem ainda crê
ser também Portugal?

Ai, os ventos
que tardam
e as mordaças
que calam o grito
da vondade
plural!

Se acordarmos tarde,
tarde será,
para que o dia
seja pleno de (r)evolução,
nasça o Sol em cada um
e haja outro amanhã!

Fujo

Fujo
para pôr fim,
parar,
senão enlouqueço;
é um desmaio.
A terra
e a solidão
fazem-me crescer.
Medito
para não pensar,
(re)educo o crer
e procuro-me
no caminho
e no amor.

Aqui, nasci,
aqui, aguardo
a morte
ou um (re)começo.
Aqui, sou mais eu,
desprendido
de vícios
e de olhares
que me ceguem.
Aqui sou mais de outros
mesmo por (re)conhecer.
E aguardo na serenidade
de minha madrugada
um outro amanhã,
onde vingue o meu sol.

O Homem

O Homem
já não tem idade
para tanta irresponsabilidade,
se prender a instintivas tradições,
se refugiar em utópicos mitos,
inventar crenças
que lhe sirvam de escudo,
e lhe dêem poder...
Como se a inteligência da natureza
fosse estática
e ele a obra prima
do Criador.
A caverna
não é mais seu habitat.

E somente
o universo persiste
como tecto,
sabedoria
e futuro,
espelhado no infinito
de sua alma.

Predador

Sinto, ainda o medo
de teus silenciosos
e repetidos passos,
na invasão premeditada
do intimo mais sagrado,
sobre as perdas de uns
para teu usufruto,
num inesquecível outono.
Nas pisadas deixadas
de teus contraditórios actos,
na eloquência de teu desespero,
na incongruência de tuas (in)verdades,
na ansiedade de justificação,
na vítima que se inventa à pena,
na culpa que promete pesar,
não dar descanso...

Finges-te esquecido
do que tudo sei,
incutes confusão no óbvio
e mascaras-te de virgem,
como se nunca tivesse já acontecido
uma outra primeira vez.

És artista da vida,
perdido no papel que te cabe,
representando ao espelho,
temendo o palco da consciência,
sem compaixão alguma
pelo drama dos que te restam
e ainda te amam.

Reinas no mundo da ignorância,
como um louco,
sonhando com um tesouro,
que te compense a pobreza.

Depois de ruir a casa,
aconselho-te pela última vez,
que te lances ao mar
das cristalinas emoções
e aprendas a nadar
como mais um peixe
que cresce na igualdade,
de Aquário,
até que encontres
o sol da tua paz.

Não pertence o perdão
ao predador
e jamais te acharás, aqui.

Guerreio-me

Sinto-me dividido
entre Animal
e Deus.
Ainda, acredito
no Homem
e no Ideal
por desvendar.

Guerreio-me
na solidão
para nunca ser só.

Elevar

Servi-me de ti,
para exorcizar
os meus instintos,
confrontar
os meus fantasmas
mais recônditos...
E tu de mim,
para exercitares
o poder do velho ego,
que te compensasse
da complexidade, desde agora...
E não nos conseguimos
elevar no sentimento
que nos unisse
ao futuro dos afectos,
ao amor...

Quando dou,
já recebo!

Sonho

Sonho
com alguém
que veja melhor
do que eu,
para que me indique
o meu caminho,
e possa, assim,
ver a luz de mim,
e saiba feliz,
agradecer
e retribuir,
dando-me
no que sou,
possuo,
penso
e sinto.

Sonho
com a evolução.
Renego
o que já de mim
morreu.

Não sei no que acredito

Não sei no que acredito.
Procuro-me
no que dificilmente
alguma vez encontrarei...
Mas não me consigo deixar possuir
pelo vazio do silêncio;
com as dores da estagnação
e morrer sem permitir ao pensamento
que voe para onde me queira levar.
Por que um céu assim
tem um azul mais azul
e as searas são mesmo de oiro,
quando só ele sem receios,
me dá a liberdade
por entre eles flutuar.
E os homens são mais autênticos
sem o saberem,
quando se confundem
com toda a natureza
e tudo é mais parecido
com o que acredito
na minha permanente busca
à revelação.
E sinto-me insignificante
ao todo do saber
sem compreender os limites
e o tempo
que estão para além de mim,
neste agora, que constantemente me morre,
até quando tudo permitir.

Não sei no que acredito,
mas há uma voz em mim
que clama por Ele,
mesmo que O negue.

Nunca me aceitarei

Nunca me aceitarei
no que me prende à Terra,
quando me convenceram
da perfeição ao céu.
Não foi, quem dizem,
quem nos criou.
Só assim, poderei
compreender a natureza,
aceitar o divino
e viver sem temor
e culpa.

Mas continuarei
a achar-me ridículo,
com as coisas
que visto
e inúteis
com que convivo
e diariamente
me prendem
me empobrecem.

Os cravos estão mortos

Como é possível,
os homens e as mulheres,
que fizeram eclodir a primavera,
depois de tanto sofrerem
soterrados num longo
e terrífico inverno,
permitirem que um outono
cinzento-provações,
lhes cubra as cabeças,
ameaçando o futuro da esperança
por que lutaram,
sem que nada incomode a lembrança,
como se agora, seu sofrer
fosse de cegueira
ou a demência?

Os cravos murcharam,
estão mortos!

O meu relógio

É sobre o céu de outros
que trabalho o meu.
E faço das palavras
a poesia de cada um,
e também um de meus melhores,
de muitos, rios,
de mim nascidos,
que em mim desaguam;
o da procura,
ao oceano do sem fim.

O meu relógio
tem pelo menos,
dez ponteiros;
para que assim entenda
o tempo
e a vida...

O meu relógio
pulsa
como um grande coração!

Solidão

Amei-me em ti,
sem o saber de tão grave.
Deixei que me habitasses
sem querer ver teus passos
percorrendo-me habilmente,
por entre o silêncio de meu sonho.
Sentia-te como minha
na verdade que te queria,
no prazer compartilhado,
no apoio consentido...
E achava-te bela e pura
como um pequeno lírio
sumido num campo de muitos verdes.
E eu sempre que podia
te amparava dos ventos,
protegia da chuva,
acariciava como o sol...
E tu dizias-te constantemente perdida
e chamavas por mim
como pássaro ainda no ninho
que espera alimento de sua mãe,
recriavas-me na importância
que imaginava que me desses
e nem respirava
sem que te pensasse,
e nem me via
sem que te pressentisse,
e não te sabia
por que me perdia no medo
que arduamente me trabalhaste.
Tudo parecia correr
conforme me prometera
e não havia mais tempo para nada,
senão escutar-me nas tuas palavras,
e assumir-te nos meus pecados,
e carregar-te aos ombros
quando temias pisar o chão, de cansaço
e te mostravas como criança, diante o pai,
compreender-te pelas noites fora,
quando te apetecia não dormir
e apenas falar de ti.
E contavas-me como te criaras,
e em vez de fadas
consternavas-me com os monstros
que te seguiam desde o berço
e todos os animais
que aniquilaste nos bosques,
que conquistaste,
em noites de qualquer Lua,
nunca por querer,
mas como um anjo obediente,
que cumpre os sacrifícios, os rituais,
solicitados pelo seu Senhor.
Das almas que infernizaste e roubaste
como se justa e fiel, fosses,
aos desígnios de toda a natureza.
E de como te ajustavas
à realidade da sobrevivência,
como se a fragilidade de tua sensibilidade
te personificasse de ingénua.
E sempre que te via eras imaculada...

E queria continuar
esse enamoramento comigo,
convencido de haver felicidade,
algum dia por aqui,
quiçá em outro qualquer lugar,
onde também fosse possível lá estares,
sem de facto, nunca te ter amado.
Mas me preferia assim
mesmo triste e só,
vendido a um desejo qualquer
que te coroava
como se eu fosse rei
e homem...

E quando te quis
não te encontrei
por que nunca assim exististe.
Quando acordei
eras tão pouco
e insignificante,
paupérrima,
e feia como o diabo.

Não há educação,
conhecimento,
e/ou reconstituição
persona ou às entranhas),
que te valham,
nem amor,
nem perdão
que te dêem vida.
Lentamente te matas,
em tudo que mexendo, estragas,
por tão azeda seres,
sem ainda teres apunhalado de vez
o cordão que te prende
ao mais vil e impuro ventre
da puta-mãe que te pariu,
e que nunca confessou
com quem dormiu
para que nascesses.

E tu sim,
és a Solidão,
e ela.

Eutanásia

Perdi o jeito para viver, assim.
Já não sei.
Não me apetece mais.
Tenho o direito de nos querer felizes
e o dever de ser autêntico.
Tudo é-me banal
e feio,
e mau...
Nem o amor já me surpreende,
nem eu...

Abreviarei a vida,
sem dor,
nem sofrimento,
ao incurável ontem,
ao instável e ansioso amanhã,
para que seja o agora,
num espaço para todos, habitável,
em cada um de nós,
por nós,
vivo!

Juízos

Ontem, olhaste-me fixamente.
E mostraste-te, como sempre,
de modo a que te apreciem
e te valorizem,
como único, o melhor
e jamais te rejeitem...
Por detrás do teu sorriso,
havia um dissimulado desdém,
e de mim, os juízos,
que te tranquilizassem.
E deixei que representasses
sem te saberes tão mau actor,
para que aliviasses o sofrimento
de teus complexos,
e por o imaginar medonho.

Como podes ainda estar tão longe
de seres tu,
valorizando-me de mais,
no que tanto desprezas
por tudo o que em ti temes?

Que idade terá Deus

Quando Deus criou o Homem,
tê-lo-á feito à Sua imagem.

Ou terão alguns homens
inventado Deus
(O que nos criou e nos castiga),
para que se sentissem Ele
e assim reinassem,
sobre os puros,
os carentes de acreditar,
os que O procuram,
os desejosos de salvação,
os perdidos,
os indesejáveis,
os desordeiros,
os aflitos,
outros poderosos?...

Na história do Homem,
este Deus nasce bem mais tarde,
do que Ele.

Que idade terá, então, Deus?

Império

Depois do Édipo de Tolerânica,
da Revolução da Cruz,
tornou-se lentamente poderoso, Temporal, o império,
que dificilmente de outro modo resistiria.
Alastrou-se mais tarde por terras novas
e impôs-se a todas as almas,
como único representante da verdade (e) do Divino.

E continua Roma
a ser, a capital
do desassossego da fé,
os bastidores
do poder do capital,
do império.

Em cima de uma cadeira

Depois de tanto
e desesperadamente
te justificares
como, agora, consegues,
esgotado o argumento,
e sem haver público que te sustente
viver, em silêncio, de pé,
em cima de uma cadeira,
com a amargura de tuas respostas,
a sós contigo,
no palco de tudo o que aconteceu?
Já não tens refúgio
na agressão vinda de fora,
nem palavras que te magoem,
nem feridas que maquilhem
a inocência com que te mascaras,
nem aplausos que te iludam.
Já não tens mais espaço em ti
para tanta encruzilhada,
nem esperteza para toda a imaginação.
Já não há espelho que te engane,
nem vergonha que não te confronte
a todo o tempo em que te pensas
e te debruças sobre o desejo de amanhecer.
E teimas em te fingir
de sobrevivente imbatível,
sempre desertor do que incomoda e trai,
em não morrer no abandono que te persegue,
em esconder o que não te pertence,
nas histórias que te contaram.
As outras melancolicamente guardas,
sem as querer ouvir,
para que nunca sejas tu
te descubras na loucura,
e te conheças na responsabilidade.
Como consegues ainda
te equilibrar em cima da cadeira,
para que melhor te vejam e te admirem
todos os tristes que dominas,
quando estás dentro de um poço,
onde nem um fio de luz cai?

E que sei eu

Prefiro não preterir o mal,
para melhor me redimir,
do que me esconder bem
na presunção de santo.
É pouco o que julgo ser,
mas também há tudo
o que todos são.
Quanto mais me acho na diferença,
mais me concluo igual.
O longínquo passado é-nos tão comum
e presente,
recôndito no ínfimo
de nossa grandeza,
sem que quase tudo se saiba.
Deverei aceitar
a intolerância
ou pensar universo?
Todo o fenómeno tem uma origem
e gere efeito(s),
e todos os corpos
estão sujeitos às leis da física...

E que sei eu
de tudo isto,
e de mim?
Não sei!
Muito
pouco!

Puramente

De mim, gostas tanto,
puramente,
que nunca te sentirás
triste e só
a meu lado,
seja o que for,
esteja onde estiver.
Mas, temes a maldade dos fracos,
que fazem da cobardia arma,
da intolerância escudo;
travam o movimento mundo do mundo...
Como se fosse ainda um menino
necessitado de protecção,
de colo, de mãe, de irmã,
sempre de ti, presente.
Como se nunca tivesse crescido
e saído dos braços de tua alma,
como se nunca (re)conhecesse, em mim,
a força do amor que sempre me deste
e soubesse dar valor
ao que é simples,
belo
e sublime,
como tu.

Não deverá o cão

Não deverá o cão,
fiel amigo do Homem,
ser tratado como gente,
nem qualquer humano
domado como cão.
Serão bem mais felizes
se cada um, aceitar a sua condição;
um deve obediência,
o outro ter liberdade
para o ser.

Há cão que não conhece dono
e os donos do abandono.

Fá-lo por ti

Deixa-te ir
para onde te levas,
sem forçar a procura,
sem temer o que te espera.
Não atraias,
o que deverias
já ter aprendido
e sejas vítima
do que projectas,
mas vibra com a alquimia
das puras transmutações.

Se alguma vez chorares,
fá-lo por ti,
nunca pelo(s) outro(s),
e que seja por fim,
de alegria.

Nunca sintas o tempo;
antes, aproveitá-lo.

Cruzado

Se me desiludi
foi por que não enfrentei
o que se me apresentava,
mas o que me servia
para que aprendesse.
Não me devo culpabilizar
pelo que desconheço,
nem rejeitar
o que julgo não merecer.
A riqueza conquista-se,
assim, trabalhando,
e são as tarefas mais árduas,
que me fazem entender
o valor da realização
e a grandeza da dignidade.
É pobre quem teima
em não se sentir
e conhecer;
viver na pele errada,
ou parasitando...

E eu,
também, sofro de pobreza,
lutando
para me conquistar,
no que me acontece
ao caminho de mim,
cruzado
com quem se me atravessa,
nem sempre pronto,
nem sempre capaz de me vencer.

Hoje

Hoje, o Sol estará cinzento,
pouco antes da meia-noite.
Os deuses sentados
nos quatro cantos da mesa
disputarão entre si as sortes
do céu e da Terra
e toda a noite será de discórdia,
até que o Sol brilhe dourado,
pouco depois do meio-dia,
para que enfim sosseguem
e adormeçam,
e haja paz nos corações
de todas as criaturas,
que ainda sonham
com o acordar.

Sedutora

Não forces (de) mais
a tua porta, em mim,
o que guardo é sagrado
e muito ,
mais do que sabes
ou te lembras,
para que te vejam desnudada
e impura.
Não te sirvas de mim
como abismo,
por te pesar tanto
o que de ti (não) fizeste,
transferindo a culpa,
para atingir a salvação...
Desde o início,
conheço-te na mentira
e meretriz.
Já não te chegam (também)
as migalhas do pobre ancião
que airosamente rapas,
nem o que ainda usufruis
de sua descendência,
desonestamente,
sem que alguma vez, tenhas sido,
porventura, cigarra,
e jamais formiga;
mais ignóbil serpente?
A tua terceira casa está vazia
e a vizinhança escondida,
e fora silenciada...
E já não sabes mais de ti,
sem que consigas findar,
nem como fingir.
Mas continuas sedutora
como a morte;
traiçoeira .

Desistir

Se me exijo desistir
é por que já estou morto,
incapaz de (pro)criar,
e de (con)viver, com o mal,
e de ser alquimista,
e na imundice...
E nem eu,
nem a mãe natureza
queremos que me sobre decadente,
mas que me lembrem vivo,
enquanto estive disponível
com toda a minha libido
a todo o amor.

Quando se bebeu do cálice
jamais se teme o fim;
quando apenas resta o outono
que anuncia definitivamente
o tal inverno.

E se for esse o meu desejo,
que seja o último,
por que a fortuna de qualquer homem
é; ser digno de sua existência,
por tudo o que semeia,
pelos frutos que ainda dá,
pelos amigos que atrai,
por todos a quem vale...
Estar inteiro
e ter fé.

O teu homem está ferido

O teu homem está ferido
tão profundamente dilacerado,
por entre os muros de sua infância,
e nem ele, nem tu,
querem assumir as chagas
e demonstrar dor.

Mas é tão óbvio
pela necessidade como te mostras,
nos jogos que fomentas,
na agressividade que recrias
na linguagem varonilmente erotizada,
nos modelos com que te identificas,
por quem somente escolhes;
submissamente,
consiga fazer-te sentir bem,
o melhor,
o desejado,
um macho...

Mas o teu homem continua ferido,
sem se querer endurecer,
por que nunca serão mais importantes,
que tu e ele,
os olhos e o espelho que vos vêem.

Não é a arma que faz o guerreiro,
mas como sabiamente a manuseia,
seja qual for o campo de batalha,
o inimigo
ou amigo.

E finge-te,
para que agrades,
de qualquer coisa,
sem nunca o conseguires ser
saudavelmente livre
e Homem.

Balança de mim

Continuarei à espera
que um de teus eus,
me bata à porta do dia certo,
que ainda desconheça,
acredito existir.

Poderá emergir
das profundezas de ti,
quando se revelar necessário
e assim tiver de ser,
sem que aparentemente contribuas,
ao cumprimento inteligente dos ciclos,
por entre gastos infernos
e vis sombras,
que sempre te atormentaram,
sem que alguma vez tenhas (pre)sentido,
sem mesmo tu
saberes que ele é meu,
para te redimir
e calibrar a Balança de mim,
ao peso certo,
do amor sem medida.

Honra

Honra todos os teus antepassados
e nunca responsabilizes por tua vida,
teus mais directos progenitores.
Humildemente, regracia-lhes
o portento de tua existência.
Se tiveres notícia
de todos os teus predecessores
talvez, mais facilmente, desbraves
o futuro que há em ti,
por evoluir,desde sempre,
e combatas com a espontaneidade da afeição
a cultura do instinto.

Humilde condição

Sinto-me repartido
entre o Ideal
e a Terra,
por tanta discordância...
Não sei mais onde procurar
para que me encontre.
Isto de, constantemente me inquirir, pensar,
leva-me para tão longe,
sem que mais entenda,
e pretender ser grande e especial,
faz com que me esqueça, facilmente,
de como nasci.
Não vale a pena ir
para onde não sou,
e sofra,
e me desiluda,
por esta humilde condição.
Caiba-me na casa
tudo o que herdei
e queira ter vontade
de trabalhar o(s) caminho(s),
para que me baste
e complete.

Não pode

Não pode alguém saber tanto,
quando se encarcera
a ser tão pouco.

A vida não tem preço
e só se vende
quem desconhece
o seu valor.

Nada acaba

Nada acaba aqui,
mas como sempre,
e em tudo,
há mais um (re)começo,
do que o fim.

O mar é gigantesco,
mas tem limites
e uma infinidade de portos,
e o barqueiro não deve ter mais pressa,
do que, o que navegue,
sobre as ondas de cada segundo,
ao sabor de, o que o céu indica,
e tanto azul que às águas dá,
e que lhe soprará de feição;
ventanias gravadas de liberdade.
E que tudo o leve até à ilha
de todo o amor,
bem lá no fundo (e)terno de si.

Quero mais uns dias

Todas as cores estão comprometidas,
presas no silêncio.
E o negro se abate
sobre este Mar de tantas esperanças.
E ouvem-se amarguradas vozes,
clamando por equidade.
E na grande Praia
jaz uma multidão
esquecida de tantos séculos
e renascer.

Não quero outono
que se complete,
nem inverno,
em que apodreça.
Quero mais uns dias,
somente, mais uns dias,
para que se quebre este sortilégio
de ignorância
e veja finalmente, a lucidez
dos homens bons
como vitoriosa.

Idade

Não é dura a realidade da vida,
mas, antes, e complexa, a da natureza;
de toda a natureza!
A vida (re)cria-se de (im)perfeição,
a natureza é exacta e (re)criativa.

Deverá o Homem aceitar o caminho
que o leva a Deus,
não mais, O (re)inventando,
aprisionado em si,
erradamente,
cristalizado;
contra-natura.

A idade adulta da consciência
é alcançada,
depois de se ter mais de cinco vidas,
mas melhor, e possível,
será vivê-las
em uma só.
Esta não é a realidade da vida
mas, provavelmente a da natureza
e inteligência.

Tenho idade de vida.
Não sei se terei outra,
ou lá chegarei.

Umbigo

Invejas a coragem
a quem é,
o que não és,
e possui,
e nunca serás capaz.
Olha para ti,
e mede-te,
e não para o teu enorme
e feio umbigo.

Ladra, cadela, ladra

Ladra, cadela, ladra!

No cio da ambição
copulas com os cães
da fortuna,
sem faro às soluções.

Persistes em nos estontear,
girando em fechados círculos.

Não há trela,
que te guie a bom caminho,
nem açaime,
que nos controle a raiva.

Já foste em tempos,
de vacas-gordas,
satirizada
de a grande porca
(onde todos mamam),
e poderias, agora,
ser coqueluche
usando alma-cheia
de gente viva e feliz,
em vez de presunçosa rafeira,
sem matilha que a honre.

E as crias vão-te morrendo
sem que já haja berço pátria,
e te valham as tetas;
parecendo enormes,
estão mais que secas,
pela desvergonha de alguns.

O osso é mais difícil de roer,
depois de comida toda a carne.

Ladra, cadela, ladra,
que é a vida que nos morde!

Há quem se esconda

Há quem se esconda,
em silêncio,
de suas próprias mentiras,
para se contrariar
à certeza dos outros,
ou exagere,
enaltecendo-se de virtudes,
para, sem querer,
justificar todas as inverdades.

A importância que se dá
ao que fere
e se rejeita,
tem a dimensão
do que está fora de domínio
e por resolver.

Tudo faz sentido,
mesmo quando se age
como nunca, convictamente,
se imaginou.
Preferir o caminho errado,
é morrer em si,
ou não voltar a trás.

Querer quem, cegamente,
se procura,
para que se compense
do que em si jamais sentiu,
faz do predador,
vítima sem posses, falida,
e do infeliz sonhador,
um falso herói;
a inconsistência
de toda a ilusão.
Sem nunca saber hora certa,
do que lhe cabe
e pertence experimentar,
para que não tarda,
crescer,
e ser,
e tudo, em si,
ainda, despertar.

Conheço-te

Conheço-te mais,
possivelmente, do que a mim,
para que me enganes,
mesmo que te convenças de tão puro.
Não é no que me dizes
que te revelas;
quanto mais peças, me deres,
mais sentido fará o puzzle.

Conheço-te tão bem
que te adivinho,
antes mesmo que te apercebas,
de desejares
o que te compense,
e o instinto te propõe.

Conheço-te tão bem,
que me confundo
e por vezes, me (des)(re)conheço.

Chaise longue

São poucos os que me ouvem,
como se as palavras não lhes descessem,
quando lhes falo e/ou escrevo,
atingissem o âmago de sua memória,
fossem capazes de os distrair,
não os fazer olhar, assim, o mundo ao qual estão presos,
sem nada ou pouco verem para além do que lhes se apresenta como tão real,
ou acordar de um qualquer sono profundo de morte.
E se perdessem, num imenso barulho,
por entre a espuma de uma onda que tão velozmente se espraia,
e lentamente se devolvessem e afundassem no mar,
ou fossem gotículas de água presas entre si, formando a nuvem,
que rejeitam ser chuva,
cair na aridez dos dias dos homens cinzentos.
E eu, um louco, como se tudo o que digo e escrevo,
tivesse inventado naquele segundo,
sem nunca antes ter sofrido, vivido na carne, trespassado a alma,
levado ao exagero, para me vencer no delito,
mergulhado no mais impessoal dos pântanos,
até Hades me bliscar à vida,
e não criado o afastamento, para que os meus sentidos não se soubessem aliciados por medíocres estímulos,
e a lucidez não se mantivesse alva e fluída,
para em silêncio se consagrar ao infinito de toda a essência.
É tão difícil ouvir, entender, o que nos confunde na segurança,
faz avivar a dor para que se agigante!...

É sempre melhor fingir de diva,
deitada numa chaise longue,
num qualquer sítio ajardinado de paraíso,
de costas voltadas para o inferno dos demais,
numa das últimas noites de romantismo,
já sem estrelas, nem luar
e de velas apagadas pela brisa da maior das pobrezas, futilidade.

Apenas Um

Nem sempre luto
com o que se me apresenta,
mas com o que julgo desconhecer
e, que desde sempre, me habita,
mesmo muito antes de mim, agora.
É um guerrear dissemelhante,
que deveria não mais enaltecer,
para que me não falte pujança,
e constantemente me vença.
Mas há tanto que me aparta
e inibe à lucidez que apazigúe.
Preciso de água;
que um rio me banhe a alma
e de mim expurgue
esta terra rochosa,
resistente à erosão da esperança.

Tudo depende de como se lê
e sente o que se vê.
Nem sempre está nas minhas mãos
o poder, para mudar a tristeza
que o mundo pesa.

Serei capaz!
Quero ser capaz,
de aceitar todo(s) o(s) Eu(s),
que comigo, constantemente, se cruza(m),
me afronta(m) e desafia(m), ao amanhã,
até que outro, que me espera,
no fim dos fins,
de que nunca me lembro,
mas experimento-o, sempre presente,
ao desenho desta história,
e deste ser de todos,
apenas Um.

(De)caída

Não gosto de te ver (de)caída,
por tanto de atirares ao chão.
Nas birras,que teatralizas, e bem,
há quem fora indesejada,
uma criança, completamente só,
que tudo quer, mas nunca sabendo,
o que de cada coisa fazer.
Uma princesa paupérrima,
sem castelo, nem palácios,
que a queiram e guardem,
sem beleza que encante
cavaleiro de sonho,
sem dote que a valorize
nem jóias de vida,
que lhe adornem a alma,
sem reino, em alucinações prometido,
sem súbitos que a adorem e sirvam,
nem amigo que a estime...
Quem humildemente nasceu
e só com essa virtude
poderá, quiçá, um dia reinar
no mundo dos belos.

Não gosto de te ver (de)caída
fingindo de vítima
ou ser a glória,
quando te encharcas
na lama do desespero.

Anafada, como moeda de troca,
ao ouro que se vingou,
esperas o perdão do tempo.

O poeta dorme

Quando, questiono,
poetizo,
não restam dúvidas,
silencio-me.

O poeta deitou-se
com a pena a seu lado,
e rasgou em mil pedaços
as brancas folhas,
do que poderia, ainda, se quisesse,
ser escrito,
e espalhou-as sobre o leito da noite,
como lençol de tantas vidas, por compor,
onde se forçou a adormecer,
atormentado por tanta impiedade,
sem vontade de, cedo, despertar.

Ninguém sabe
quanto dura o sono do poeta.
Poderá até, não mais acordar.

Resta o que questionou,
para que seja questionável.

O poeta dorme,
com ou sem poesia.

Conflito

Tenho receio de morrer,
mas estimulo-me ao abismo.
Esta incognitude de desejo
e aparente incongruência de viver
são bem mais intensas do que eu,
para que, tão simplesmente, desapareça no nada,
sem que recrie os limites do desassossego
e o que vem das profundezas de mim,
como se, fosse sem querer,
a todo o momento, e anseio,
o que me (re)desenho aos apelos do caminho,
e antes, nunca o tenha sabido.

Se pratico alquimia,
não terei de ser, também, milagreiro.

É o espelho que me mata;
e tremendo sempre foi o conflito,
entre o que hei-de ser, e sou,
e nele (me) reflito,
exagerando, o que compense,
ao que ainda não me sei,
para que a inteligência que me rege
me una até ao fim.

Descanso,
terei mais tarde,
o eterno,
quiça morto.

quinta-feira, 22 de dezembro de 2011

Um qualquer Sebastião

Estamos demasiado pobres
para sermos, agora, grandes.
Até os que se julgam com posses
não lhes chega a riqueza,
para que, aqui, a exerçam dignamente.
Em tempos, houve gente humilde
que fizera de sua coragem
a fortuna de todos.
Hoje, por ambição temos, poucos,
mas que chegam,
apagando de nós a memória,
traidores, grandes,
da felicidade alheia;
de ricos, pobres...

Os homens de viril raça morreram.
Somos viúvas, em terra estéril,
povoada por sombras,
sem esperança
de que um qualquer Sebastião nos renasça
deste medonho nevoeiro,
difícil de levantar.

Engano

Quanto mais me exibo,
mais (me) (vos) engano,
até que no silêncio da aceitação,
humildemente, me passe despercebido
e cumpra, tão simplesmente,
a plenitude de mim.

Sobreviver

Não sei se há gente má,
sei que há boa.
Para se sobreviver
não é preciso tanto,
somente o que nos baste.

Não (me) consigo

Não (me) consigo
sair desta parte de mim
a que me entrego,
fugir do que não quero
sem que magoe,
descobrir no que serei
sem que me sonhe,
abater de vez
sem que me repita,
para que ressuscite
inteiro,
sem que me negue
presente.

Depravado

É depravado
declarar-se iluminado,
e denegrir,
compensando-se assim das trevas,
ateando-se ao inferno
do sem fim pequenino.

Cada um tem o céu que conquista.

Que não se fale de amor por necessidade,
mas antes, se o faça, com franqueza.

Luar

Se o sonho é meu luar,
então, serei Lua,
e salpico os pés de mar,
e deito-me ao comprido
pelo enlevo da noite,
e bato de mansinho
na vidraça de uma janela,
como se a brincar,
fosse ainda menino
e tu, ela.

Só por que me feriste no coração,
não me roubarás a alma.

O tempo lava-me de más lembranças,
que (me) saiba(m) perdoar,
para que, me (re)crie, sempre, caminheiro
sem nunca pressentir, por perto,
a loucura do teu desamor,
o ódio de tamanha inveja.

Quem se nega a crescer
será pobre para a eternidade.

Greve Geral

Greve Geral?!
Vão, mas é, trabalhar!...
Como é possível, quando há quem ainda não
esteja suficientemente rico,
à custa da vossa labutação
e tenha já, para roubar, muito mais tempo?

Greve Geral?!
O que ganham com isso?
Nada!
Mas há quem precise do vosso esforço,
para que lhe cresça os lucros
e nada vos sobre!

Greve Geral?!
Vão, mas é, trabalhar,
que o senhor engenheiro vos agradecerá
com mais umas quantas promessas de nãos!...

E viva,
in feliz democracia!
Viva!

Nada há

Nada há, que, justifique
o injustificável,
se esconda
no mais completo dos silêncios,
não se revele a seu tempo,
seja um (a)caso isolado...

Nem todo o espelho é frágil,
mas toda a pose tem um sentido
e serão poucos, os que se saberão olhar
e ver.

Guerrear pela vida

A morte é a mais violenta derrota
de qualquer batalha.
Todo o guerreiro tem o desejo de vencer,
na luta pelo que defende.
Vitorioso nunca será ao aniquilar
a outra parte, do conflito,
também tão honrosa, nobre
e audaz de si.

Guerrear pela vida
com tudo o que mexa,
para que se construa o Homem-deus
de todas as civilizações
e não o carrasco absolutista
prepotente de verdades,
reflexo de fragilidades
tanta mentira...

Aqui

Aqui, quem capitaneia é a inconsciência
dos incompetentes;
uns possuídos pela ambição,
cegos por egolatria...
Outros incapazes de se comprometerem
com pertinentes decisões,
vendidos às conveniências...
E há os demais,
que sofrem de (des)ilusão de promessas,
vergados à gravidade do abismo,
desmembrados do que é factual...

Mas o melhor dos mensageiros retrocede,
para nos trazer,
o que ainda não foi dito,
aqui, em baixo,
confundir,
e esclarecer.

Tudo merecemos,
por tanta ignorância.
Deveríamos, já ter aprendido.
E aprendemos,
mas devagar.
E tão rapidamente
logo tudo se esquece,
e repete;
repete, repete, repete...

Valha-nos Deus

Se a vontade de Deus é bem mais poderosa,
do que quaisquer de meus terrenos e simples quereres;
no que faça, mesmo que peque e não me contenha,
e não consiga, mesmo, muito acreditando crer e a Ele ser temente,
então tudo não passa, porventura, senão, de mais alguns de seus santíssimos caprichos.

Mas, apesar de não me ser fácil, entendê-Lo, aceito-O, tal como O imagino.
Cada um recria-O à sua maneira.
Ele, também, assim fez connosco.

Valha-nos Deus!
Deus nos acuda
e nos livre, também de Si; Sua justiça divina,
e de todo o mal!
Amém!

Berço

Quanto menor for
o berço da infância,
mais difícil se torna, de sair,
e desabitar o futuro,
para que se;
abrace a consciência
em liberdade,
faça a grande viagem
ao mundo do(s) eu(s),
descubra paisagens do tempo,
mergulhe às profundezas da existência,
envelheça ideias,
aceite o óbvio
e seja o que se é,
sem que se represente o drama
da insuficiência
e do medo,
com as personas
do orgulho
e do poder.

Só o silêncio
abre caminhos.
As palavras são muitas
e estão presas.
Não sei mais o que quero,
sem que me prefira
e mate ao propósito
de poder renascer
e ser diferente,
sendo sempre o mesmo...

Boas noites

Acentuam-se os rumores de inquietação,
desde a imaculada
até ao velho, quando morrer.
E antes que seja Entrudo,
libertará, o povo, o grito
ao que teimou em ser estrutura,
antes que o deus do tempo
beijasse o caminho do equilíbrio,
ao fim do ciclo.
E a dureza do inverno prolongar-se-á
até à conquista de outra primavera,
pois ainda habitam flores no coração dos esperançados,
apesar de fatigados por tanta imprudência
e vil injustiça.

Por fim, a mais recente das constelações
cairá por terra
por que no céu
só há lugar para estrelas
que alumiem
boas noites,
ou então, que seja dia.

Sem futuro

Não há pai que se corrija,
nem mão que se imponha,
nem modelos de virtude,
nem vergonha,
já nada para semear,
o que dê sentido e força
à vontade de erguer,
ser povo
e ter voz...
E olha-se o futuro,
perdidamente mortos,
sem futuro
que nos dê fôlego.

Gosto dos números

Gosto dos números;
vinte e dois,
dois,
e quatro (dois mais um e um).
Gosto?
Não sei se é gostar,
talvez, seja um desejo,
de querer neles crer.
Às vezes os números
dizem tanto,
sem que os saibamos ouvir;
o que têm para nos contar
ou prevenir.

Prefiro os mestres
e positivos.

Atento-me

O dia sabe-se,
vê-se,
e é um pequeno acrescento
da noite longa,
onde tudo dorme
em profundo desassossego,
e se esconde.
Acima do horizonte
brilha o ego,
mostrando-se, resplandecente
como crê,
um sobrevivente.
Nos confins das sombras
afoga-se
a impessoalidade
em silêncio,
no tempo que não se esgota.
E a glória
do que se transmuta,
oportunamente,
é pura alquimia de deuses
sobre anjos caídos,
em trevas comuns.

Não me temo no que já fui,
no que conheço,
mas sabendo-me mais,
atento-me.

Homem e predador

Vim do primo mar,
apurado fui, em eternidade,
em contratempos,
até ao que sou;
Homem,
e predador,
com maiores domínios.
Tão especial,
que, me reinvento perfeito,
único
e na origem,
adoptei como pais
o Grande Rei
e a Mãe Natureza
dos céus e da Terra,
creio que só tudo existe
por que sou a grande causa,
e obra do Criador.
E não sossego de ambicionar
e me escolher com os mais semelhantes
e fortes
à glória do poder,
sorte do(s) elegido(s),
e da melhor solidão,
para que me chegue,
e jamais me lembre
de minha condição
e insignificância.

E quanto mais me julgo
pela diferença,
mais me atrapalho
na inteligência,
menos entendo,
não sobre a grandeza,
mas, minha real fortuna.

Nunca serei
o que não sou,
para que me deseje
ao que me sobrevier,
em vez de mim, agora,
melhor.

Me vença

Avisto constantemente
o abismo,
não, para que, me perca
ou morra,
mas, me afoite
ao conflito
e me vença.

Modas

Olha-me, como se, me desconhecesse,
fosse assim tão dissemelhante,
não me soubesse criatura
nem tivéssemos igual pretérito,
e a liberdade subsistisse...

Somos o mesmo,
de roupagem divergente;
modas, que o tempo dita,
de gente.

Somos muito mais
do que, a aparência,
cremos ver,
a diferença.

Mais do que

Mais do que, ser possuído
pelo pastor, que guia
e condena,
é ter cão,
que, guarde
e proteja,
confie,
até que se extinga,
ante, sua missão,
a própria vida,
e subsista,
para além de tudo,
a sua mui nobre
e incomum dedicação.

Viajo

Viajo,
para me percorrer,
e achar,
e um dia,
algures,
encontrar,
sem destino,
sentido
no que está (pre)destinado.

O mais longo
dos caminhos
é o que termina no interior,
mais profundo, de mim,
feito nas passadas
expressas à superfície.

Conflito

É-me tão difícil,
que todos, em mim,
coabitem em harmonia;
inexequível.
E assim terei de (con)viver,
até me sobressair
e saber, domar
todas as forças,
entender o conflito,
como bem necessário,
me aceitar imperfeito...

O que se nega
ou esconde
é dor maior
e cobardia
de todo o agressor,
envergado de santo,
na selva da quadratura.

Máscara

A máscara difere,
da face que, oculta,
e tem as feições do avesso,
não se sabe fitar,
se dissimula ao equívoco,
sem que se descuide
que se disfarça.

Gosto de me iludir
de palhaço;
umas vezes, rico,
outras, pobre,
nunca, ao que me perca,
para que não me seja
e me complete.

Não

Não (me) devo agredir!
Quem por direito,
não saberá de violência,
para que instrua
a exceder-me
na inumanidade
e ser benfazejo?

Quem (se) agride,
por querer,
senão para que (se) sobreviva?

Trilho

Há um pequeno trilho debaixo dos pés.
Outros caminhos são mais livres de percorrer
e adivinho-os, como se os desejasse, meus,
sem saber, deste, que incorro, sair e pisar fora,
me desprender ao que me sucede, pela frente, sem que escolha, e ilude,
para que o faça, quando se aprofunda, abre no chão, como se rio, eu fosse, e transbordasse as margens, sem que unisse distâncias,
e desaguasse na eterna indefinição,
e afogasse a sombra, de vez, como se não fosse naufraga
e me viciasse a sê-lo e a sentir-me nada,
e nele a convencer-me, tudo,
fadejado a dar-lhe sentido, a vida.

Há, um pequeno trilho de baixo dos pés,
mas, envolvido, será, o corpo pela natureza
e a alma, sempre, tangível com infinito,
e sempre uma borboleta anunciando a primavera.

Não sei quem

Não sei quem, visto,
me possui e rege,
mostra o abismo e liberta,
ajuda e castra,
se anjo, homem ou mulher,
inocente ou ruim,
rico ou asno,
velho ou recente…
Muitos são,
sem que os admita
e tente contar.
Mas, quantos mais nego,
mais esses em mim estão,
como se fosse menos eu
do que eles,
tivesse de os saber
e vencê-los,
até chegar a mim,
outro que, não este(s),
não sei se me habita
já o futuro como presente,
conquisto a todo o momento
entre reputações e reveses,
temendo e desejando;
sofrendo,
amando.
Por que sem mim, houvera,
a intenção de, ou tê-los sido,
sem que se saiba ao certo,
e quiçá um dia serei eu todo,
também vós
e outros eternamente,
até mais além.
E tudo seja sagrado
por sempre o ter sido,
sem que se engane
e fuja.

É bem mais simples
ser-se
o que se é,
em tudo o que se seja,
para que se seja,
sem que se escute as horas,
(basta o ritmo cardíaco)
e deixar a mente tocar o céu,
como qualquer pássaro,
livre de escolher voar.

Urgente

Estou, mais que, morto
de tudo, aqui,
mas ainda me respiro,
por um fio de coragem,
que constantemente me (re)povoa,
por tanto, eu nos querer e acreditar.
Por entre muitas dores de infortúnio,
e mais a vil moeda com que pagam,
há uma leve brisa soprando esperança,
por um outro qualquer lugar,
também daqui,
a quem se ouse ter,
agora, a coragem do protesto,
espalhar na praia, de tantas partidas,
consentindo todas as ondas,
almejando o que de bom,
possa trazer o mar
por ser a terra uma miragem;
esgotada deste fado,
estéril,
um reino, sem reino…
Estou mais que morto
de tudo, aqui,
mas, mais do que eu
é quem se crê bem vivo,
superno
e inextinguível .

Mais do que o fim,
de uns,
é o recomeço,
para todos;
urgente!

E vós, daí,
também podeis ajudar.
Não pergunteis, como.
Quando se quer,
o que, tem de ser,
não é questionável,
estaremos bem mais além
mesmo que só se atinja...
Nunca.

Os meus depois de nós

São a esperança do nosso eu mais profundo,
a ponte que liga a outras margens,
onde nunca chegámos, por medo,
ou, chegaremos, naturalmente.

O futuro do ideal, na perfeição a que nos impomos, sem que consigamos,
como se deles fizéssemos as armas de nossa vitória,
a continuidade da presumível essência, que ainda submerge perdida, sem que se saiba,
mesclada pelas personas que mais se destaquem e que até a nós nos enganam.

Vítimas do nosso desassossego,
dominados por uma excessiva protecção, desde sempre,
pelas regras, que os conduzam, também, a um qualquer exercício de poder,
pelo hábito constante dos afectos, que incutimos e de estrategistas rotinas,
como se, a ingenuidade já não nos pertencesse e temêssemos somente pela sua cegueira,
e maturos tivéssemos sempre sido, mesmo perante os conflitos e as derrotas,
e só eles fossem incapazes de, destrinçar o perigo,
sem nós, sobreviver,
ou, não se perder num qualquer oceano do caos,
como se habitássemos em terra firme
e percorrêssemos todos os caminhos com a mesma segurança e certeza.

A responsabilidade que lhes forjamos,
por que outras terão a sua idade e o seu real confronto,
com as normas que, nos foram impostas, reinventámos, mas incumpríveis,
e tão subtilmente também as estendemos, à sua passagem,como se de flores se tratassem,
para que se sintam honrados,quando as pisam suavemente,
mas tão culpados, seja pelo sim ou não, quando fogem a essa delicadeza.

A liberdade.
Não, somente, a que nos roubaram; a de aprender.
Mas hipocritamente também, esta, a deles, desejamos, também tirar-lhes,
ofertando-lhes tudo, prendendo-os... A nada!

Fruto sagrado do amor,
mas mais no que neles, sem querer e por crer,
é em nós, primeiro, que pensamos.
E os mesmos receios que nos impedem de viver,
os definham no crescer e na sorte da feliz descoberta.

Os meus, depois de nós, herdeiros,
aprendizes do bem e de muitos erros que transmitimos,
por que também assim os tomámos,
sem que aprendêssemos a escolher entre silêncio e a revolta.

Sol ou noite

Quanto mais frágil me sinto,
mais desejo tenho de, outros, subjugar,
escolhendo os mais vulneráveis,
para nesses, das frustrações de vencido,
me (re)compensar,
ter absoluto domínio,
e vangloriar, a sós, comigo,
convencido que sou,
o que nunca me possibilito.

E cada vez mais estreito e profundo
é o fosso deste desarranjo
que separa a noite do dia,
sem que (me) queira acordar,
dar o passo,
e assim possa eu,
assumir-me sol ou noite,
mesmo sem lua.

Histórias

Todas as histórias são curtas.
Mas quase todas revestidas de muitos floreados.
As mais simples, perduram,
as outras serão esquecidas,
por entre tantas outras banalidades.

Por que escrevo

Por que escrevo?
Faço-o, para que me ledes,
sejais cúmplices deste meu engano
ou me ouça,
quando alucino
e me entupo a construir cantos.
E repito-me, infinitamente, entre mim
e outros que me invento,
mas, existem,
vestidos apenas de outras palavras,
achando que me procuro,
uno mais a mim,
e verso,
quando me invento à fuga
e desfaleço.

É bem mais forte poetar
do que, beber de um só trago
um grande bagaço,
ou fumar um grosso charro!...

Caminhos

Se mostro caminhos
e sei-os,
é por que os conheço,
percorro todos.
Não que me disperse,
mas para que siga, esses,
que faço,
como meus.

O já

Não devo obedecer ao redutor medo,
nem ser convencido por desmesurado optimismo,
ser filho deste incestuoso casamento com o mundo,
nem, pactuar, por sombras, com tamanha ancestralidade;
a ambição do poder que elege ao nada,
movida pelo desejo mais profundo de tudo,
o desassossego de revolta;
o vento que sopra diferente
e profana a instituída quietude.
O grande ideal,
que se consome no inatingível,
dissolve o chão, com o mar
e apaga o céu, com negra núvem,
das Inverdades.

A existência é o já,
por que longe de mais está tudo
o que acontece, agora
e nada poderei inovar, senão, me continuar,
sem que abone o que me resulta lá fora.

Desinteressante

Não sei se sou desinteressante,
e a hora é tarde,
ou estão os outros desinteressados,
mesmo que tarde seja, para a hora certa,
ou a minha insuficiência anseia por mais,
que me consiga ainda levantar, ter descanso...
E haja ninguém que me seja no que falta,
ou queiram muitos o mesmo que eu,
e vivamos incompletos sem medida, nem tempo,
e quem sem querer nos queira
por que o que não nos sobeja
não abundará por aí, certamente,
como milésimos de segundo
e assim o que aparentemente interessa,
quase sempre é desinteressante,
(como eu),
até que se descubra o essencial e dê inteiro, devagar,
sem que constantemente se retroceda, e erre,
e force demasiado os ponteiros de todas as horas,
e eles se desfaçam, para sempre,
como nós,
mais tempo,
menos tempo.

Os filhos são meus

Foram meus,
tão-somente, enquanto por mim criados
e têm de mim o amor que lhes (in)vesti
e ser-lhes-ei sempre, uma das naturezas mais próximas,
o tronco forte à proliferação no desejo maior de me perpetuar,
a sua sorte,
também eu,
e a individualidade,
o que se pretende tão livre,
como grandioso…

Mas, se a terra me escondeu do pomo
não me fez menos criador,
concebeu em silêncio o fruto de seu (des)amor.

Os filhos são meus
tão-somente enquanto crio.
Depois, são de ninguém,
fazem parte do infinito,
mas nunca deixarei de lhes ser,
e também co-autor,
sempre hoje e aqui.

As coisas que faço

As coisas que faço por mim!
Nunca foram por ti,
como me convenço
e aparento.

Esta máscara altruísta
esconde quase sempre, a face de meu egoísmo.

Aceitando-me em tudo
e ter nada,
é tudo;
nada mais resta
para se ser animal
e deus,
poder receber
e dar, também.

Filhos escolhidos

É tão difícil ver
quando continuamente estamos
demasiado submissos
ao que nos controlou a vontade,
a vida inteira,
condenando-nos a hábitos de não sermos nós,
o que é nosso
e faz parte do caminho
já traçado,
escolhido...
Não é o sacrifício
que nos salva das culpas que não nos pertencem.
Tudo tem o seu tempo
e ele voa;
um pássaro sem poiso,
e nós crescemos tão lentamente.
O futuro está no inconsciente mais profundo de nós,
e nunca perceptível,
o abismo que nos liberta,
mesmo que o queiramos contrariar a cada momento,
como se fossemos lúcidos
e os filhos escolhidos do Universo,
especiais...

Arrependimento

Há uns dias atrás,
passei por um jardim,
perto de minha casa
e vi umas exuberantes hortências.
Durante a noite fui colher as que tinha cobiçado
e já bem escolhido,
para com elas enfeitar, numa jarra de porcelana,
a minha sóbria sala-de-estar.
Depois de o arranjo corresponder às expectativas,
olhei, e o que ali estava exposto
era o sexo, que violentamente tinha arrancado
àquelas belas, sadias e pacíficas plantas;
a promessa de sua continuidade.
No dia seguinte voltei ao canteiro,
onde permaneciam encantadoras.
Envergonhado pedi-lhes desculpa,
para que todo o Kósmos,
também aceitasse o meu arrependimento.

Não quero acordar tarde

Perversamente provoco.
Anseio vencer-me nos limites.
Apuradamente olho e conquisto,
mas as armas já não acalçam as vítimas.
E o que outrora fora palco de ilusões e esplendor
é agora, a natureza que morre,
já sem esperança de primavera.
Hoje, pelos vistos, ainda tarda a lucidez
e persiste o desejo inconsciente de não ser Sol,
trancado na solidão de mim
e por tristeza de escuras nuvens.

Não quero acordar tarde,
para que me consiga no amor, livre e Eu.

Serenidade

Quanto mais me dispo,
mais me ambiciono,
menos possuo,
mais me enriqueço.
Não poderei querer
o que jamais me pertencerá.
Pelos degraus do tempo
não basta apenas subir.
Enquanto estiver desperto
será injusto negar a vida.
E mesmo que esteja só,
deverei aceitar todas as multidões
e sentir todos os ventos,
mesmo os já soprados,
mas sem nunca me envolver.
Gosto da serenidade que me habita
no vale do que mais me importa.

(In)Feliz

É mais feliz
quem,já por nada se ilude,
mas antes se aceita
e luta,
e tem esperança de saber crescer,
e naturalmente, ser melhor.

É mais feliz,
quem não deseja a felicidade,
mas antes nunca ser infeliz.

quarta-feira, 21 de dezembro de 2011

Depois de crisálida

Eu sou, património de vida,
e muito mais do que me conheço,
para além deste, imenso edifício,
erguido por entre a natureza,
feito de argamassa de variadíssimas moléculas,
e que constantemente se (re)constrói
e tenta manter até à validade,
que lhe fora atribuída,
e seja capaz,
corpo revestido a pele e pelos,
como acabamento, aparentando sempre final,
com formas e características que tão bem o identificam,
com outros, mesmo, os mais semelhantes,
mas único!
E serei todavia responsavél por tudo o que transporto
até ao ínfimo de mim,
sem que saiba, agora, o valor de todo o meu tesouro de infinito,
nem de quando se concretizará a grande mutação
depois de crisálida.

Tudo está escrito algures
Haja, é alguém que saiba ler.

Espero-me

Uma coisa é querer
e não conseguir,
outra é negar a oportunidade,
sem a experimentar.

Teimo em não me alterar
no que acredito,
domino,
ambiciono...
Mesmo que (n)isso seja medíocre.
E tanto há em mim!
Mas para me desbravar,
em muito devo, primeiro, perder-me
e sofrer,
para depois me salvar
e ser mais Eu,
no meio de um qualquer oceano.

Espero-me, amanhã,
no porto; naquele de que nunca se fala,
para logo de seguida partir,
sem sossegar.

Enquanto houver ventos
e marés, não se amainam velas.

Sempre pronto ao suicídio

Se alguém em mim morrer,
deverá também sucumbir em si,
se porventura, quiser que renasçamos.

Eu estou sempre pronto, ao suicídio,
desde que seja por uma causa maior,
por Amor (ou) pela Vida!

Tenho Deus como vizinho

Tenho Deus como vizinho.
A porta em frente à de minha casa
é uma das três principais de Seu templo,
a mais preciosa; abre-se por entre colunas estriadas,
que carregam enorme frontão,
onde estão inscritos uma pomba,
no centro de um grande círculo,
sobrevoado por dois anjinhos,
com uma cruz terminando, no topo de um corpo triangular.
Essa porta nunca se abre
e eu raramente entro pelas outras.
Ele sim, é testemunha de tudo o que acontece na minha,
quem entra e sai...
Ontem, escrevi-lhe uma carta
e pu-la debaixo da grande porta, durante a noite,
para que ninguém a encontrasse
e só Ele a lesse.
Nela pedia-Lhe ajuda,
para que me fosse devolvido um terço que perdera há muitos anos,
para que a oração de minha criação estivesse completa de sujeitos
e o verbo fosse Amar,
possuísse todas as contas...
Espero que o meu pedido se concretize
sem que se altere o brilho de todas as estrelas
e se for merecedor.

Desembrulha-te

Não te olhes de fora
como os que te acham.
Descobre-te no que a sempre te negas
e assim verás no teu avesso
o que te mais importa.

Desembrulha-te
e admira a beleza de teu presente!

Na casa onde mora

Na casa onde moro somos muitos.
Da minha espécie só eu existo, por enquanto.
O gato brinca comigo
e tem-me afecto,
como se fosse uma criança.
Os peixes oferecem-me tantas lembranças
e um bocadinho de oceano.
Espero o dia, em que me entre pela porta um qualquer pássaro,
que queira fazer dali, também o seu ninho
e um céu.
As plantas, rego-as com respeito,
como se fossem sabiamente velhas,
dão-se-me de tantos verdes
e em flor.
Outros, também lá vivem,
mas não são tão visíveis e sociáveis;
continuam a crescer...
Na casa onde moro,
todos temos o intuito de não sermos infelizes,
amando-nos,
e certamente, nos sentimos filhos do mesmo Ser,
desde o começo.

O Lírio

Temo essa palavra, Verdade,
mais do que quaisquer, inocentes mentiras,
mesmo que ditas por quem se diga entendido...
Creio no que me possa transcender
e eu deva abraçar incondicionalmente,
e nunca limite ao que me esforço por parecer.
Tudo o que dou foi aprendido,
mas quero saber muito mais;
ou serei o que deveria ser,
ou prefiro já não existir.
Haja Inteligência
que me combata a evoluir,
mesmo que nada compreenda,
me julgue(m) perdido no labirinto da caminhada...

O Lírio nascerá nas mentes fecundas
e será tão puro como as almas que o virão florir, em Si.
E a nuvem sagrada habitará primeiro sobre o vale dos Poetas,
antes de escalar as montanhas para se dissipar pelo mundo,
como palavras de uma só Poesia.

Flor de Julho

Trovoadas de Maio*;
ainda de águas mil,
para que se limpem as ruas da alma,
e desabroche depois, identificada,
a flor de Julho**,
num campo de considerações,
pronta a parir,
o que apenas era sonho.

Nunca desistirei, de ti, ó cidade!


* 29Abr/18Mai11
** 9/26Jul11

Ninguém diz a verdade

Ninguém,
diz a verdade,
é dono das certezas,
conhece o todo...
E todos se enganam de convicções,
por que intensa é a luta dos opostos,
e preferem ausentar-se da realidade,
e fingir o que não são,
criticar nos outros o que mais lhes dói...
E facilmente pertencem ao que lhes, dá deleite,
beneficia na (sobre)vivência...
E inventam-se como especiais, ímpares,
e crêem-se como produtos dos céus,
e têm esperança de transcender a carne,
quando ela já fede, decadente.
Impressionam até ao fim,
compensando o temor de abandono,
com o instintivo intuito do poder.
E têm o desejo maior de serem imperecíveis
como os deuses que lhes nascem,
e assumem-se como criaturas escolhidas
e abençoadas pelo divino,
e incutem o medo e o dever de sacrifício
aos mais vulneráveis e puros idealistas,
consoante as necessidades dos tempos.

É mais real, uma qualquer mentira,
do que a mais absoluta das verdade.

E cada vez mais me calo,
elejo o silêncio,
mas nunca me deixarei de interrogar
sobre isto, aquilo,
quem sou e o que os outros representam,
mesmo que escasseiem as respostas.

Fala-se de mais

Fala-se de mais
e diz-se tão pouco, ou nada.
E nem sempre, se percebe o que se pronuncia, por que se diz,
as palavras coincidem com o que se sente,
o jogo entre o que se discursa e o pensamento
flui por querer, mas por que assim foi aprendido no tempo,
mais as personas que ocultam a vera face.
E oscila-se todos os dias por entre as pedras de qualquer trilho,
diante a indiscrição da descoberta
como se só valesse o que bem se concebe, julga saber,
e o infinito obscuro dos céus,
o eterno mistério que amansa, inibe, esmaga
ou incita à revolta...
Fala-se de mais
e diz-se tão pouco, ou nada,
e cada vez mais encontro no silêncio
a sabedoria de todas as palavras,
sem que haja vocábulos que cheguem
para, expressar o que me vai na alma,
e que queiram compreender a (im)perfeição
e a inteligência que transcende toda a razão.

Herói

Do medo se faz a vitória.
Não é herói quem quer,
mas quem avassala a provação
e toma esse momento
por quem nunca viu,
nunca como seu.

Ter tudo ou nada

Eu anseio por ter tudo,
em consequência de ser pouco,
ou nada.

Mas tudo, nunca sei quanto é,
por muito mais que possua.

E com nada,
ser-me-á sempre difícil de me apurar.

E mesmo, o que tenha, seja pouco,
será sempre nada,
porque, por muito que possua
sinto a minha insuficiência e ser pobre.

Existe um desejo infinito de coisas, sem as saber,
nunca conseguindo ganhar a realidade que me sossegue.

E sinto um imenso vazio, incompensável,
não havendo grandeza que sustente a sobrevivência da alma,
nem porto sereno, no meio de quaisquer águas,
onde possam atracar as mais profundas de minhas emoções.

Terei de acreditar que, por pouco que tenha
haverá sempre uma fortuna em mim, por transmutar,
guardada, onde em tempo algum saberei, por aqui.
Emergirá no momento que me for preciso.

Só o hoje existe,
e terei de me enriquecer a todas as horas,
e quanto mais desperto melhor.

Direita e esquerda

Direita e esquerda.
O que é ser de direita ou estar à esquerda?
Ao espelho a minha direita é a esquerda de mim, na outra imagem,
e se contemplam,
e vice-versa.
Se me movo, o que está à minha esquerda vai mudando
e se giro, completando metade do círculo,
passará o que estava à minha direita, a pertencer ao meu lado esquerdo.
É muito mais fácil sintonizar-me com os pontos cardeais.
O nascente está sempre ali, mesmo que percorra toda a linha do horizonte,
até ao lugar onde se habituaram os astros a esconder...
O Homem tem uma relação intensa e profunda com a Terra e com o céu
e o seu compromisso é evoluir recto,
brigar pelos seus direitos
e consumar, humildemente, os deveres,
com tudo o que mexa, tal como ele,
esteja à esquerda ou à direita, onde estiver,e seja vida,
e faça igualmente parte deste singular projecto,
de onde ele também descendeu, no dia que lhe coube,
segundo a ordem que se estabelecera, sem que se alcance,
e cumpre.

Ser livre

É-me difícil ser livre!
Quanto mais cresço,
mais profundas são as raízes
que se responsabilizam à Terra.
Quando vivo permanentemente a renascer,
negando a morte.
Já não sei se é melhor ter consciência
se ser uma eterna criança
sem memórias,
nem amanhã.

Como pode alguém rejeitar a diferença,
se tudo é desigual?

Pesa-nos o legado do infindo e comum pretérito
sem que se enxergue muitíssimo! Nada!

Só serei livre
quando estiver para além de tudo
e de mim,
e abrir mão do que me prende
e nunca foi meu.

Perecer

Pretendeste perecer em mim
para que eu, também findasse.

Não sei qual luto, deva fazer
para que um de nós sobreviva?

Marioneta

Sexo?!
(Sobre)vivência!

Amor?!
R)evolução!

E eu,
animal de deus
ou anjo selvagem?!
Marioneta!

Condição

Quão, ridículos, somos,
híbridos, nos tornámos,
deslumbrados e cegos nos fizemos,
e perdido está o caminho de nós!

Não há deus que, nos queira,
não se ria,
nos salve,
sem que antes,
entendamos toda a história
e aceitemos a própria condição,
humildosamente!

Quão ridículos somos;
inventámo-nos
alienados da realidade
e persistimos no pesadelo!

Actual

Quanto actual sou
com a veste de minha pele
e liberdade de meu pensar.
Não quero ser tempo
para não passar de moda!
Não quero mais nada
senão hoje,
e crer, também em vós,
depois de mim!

Os meus passos

Tento decifrar os meus passos
e ponho-me de lado, querendo-me olhar sem me ver.
Esmoreço, quando meço o que ocorre,
como se num jogo oscilasse
e eu jamais o apreendesse.

Quem sou, que não me atinjo,
quando ao que me predisponho dissimulo não saber
e me passeio no ensejo, esquecido do desígnio
e acordo no que nunca quis previr
como se não existisse
e nada nunca acontecesse?

Cantasse eu outro fado,
mais concebível,
para que imoderado nunca fosse
e mais livre me fizesse do que introjectei
e tanto me pesa...

Soletra-me

Soletra-me por entre os teus lábios
e pressente-me aqui, nestes versos que te escrevi,
quando te adivinhava à minha procura.
Mesmo não te vendo o rosto,
sentia-me, já no pulsar de teu coração
como se vibrássemos ao ritmo do universo
e nos sentíssemos tão perto um do outro
e tudo fosse tão grandioso e belo.
E por cada palavra que declames aí bem dentro de ti,
é como se me inventasses como tu
e te sentisses eu
e surgisse a dúvida de quem escreve ou lê e ouve,
e eu me perdesse em ti,
por entre tantos pensamentos
e tu te achasses em mim,
por o que desejei e tudo o que te dediquei
e eu e tu fossemos todos os outros, que se escrevem ou falam
e desejam o amor, mesmo sem que o saibam descrever
ou ler, verbalizar...

E continua a ler-me.
Não páres.
Continua, por amor e pela poesia,
mesmo que tudo não passe de mais um capricho!...

Dói-me a solidão

Dói-me demais a solidão,
para que não tema o abandono,
ficar só continuamente.
E por muito que me rodeie de gente
não encontro quem me sare
esta ferida da alma tão antiga.
Tudo é demasiado vasto e intrincado
para que me encontre na casa de mim
e haja lucidez que me tranquilize,
chão que me dê raízes,
amor que não se explique,
espírito que me entenda e aceite,
berço que me oscile e reconforte a vida...

Há horizontes maiores
do que estes, de meu lugarejo
que me possam dar outras esperanças
e quebrar este cansaço de tanta exiguidade.

Se hoje morresse

Se hoje, morresse,
só eu não sofreria.
Assim como os que, me desconhecem,
mesmo que até, já lhes tenham falado de mim,
me conhecendo, não são habitualmente perturbados com a minha presença
e nem têm opinião alguma formada a meu respeito;
uns dias acham-me simpático, outros passo-lhes completamente despercebido,
como se a indiferença existisse e eu fosse incorpóreo,
contabilizam as baixas com satisfação, pensando o mundo maior, sem os que partem...

Os que se acostumaram à minha entrega
e tomaram comigo a mesma rotineira,
deixaram que dominasse e também dominaram,
me amaram para que eu também os amasse...
Esses sentiriam, se hoje, morresse, certamente a minha ausência,
enquanto no tempo, consoante o grau de dependência,
não aprendessem o amor de outra maneira.

Haveria, também, quem sentisse a minha falta,
sem que nunca, nos soubéssemos tão conhecidos.

Nada a Deus peço

Nada a Deus peço.
Seria um blasfemo, se me atrevesse.
O que tenho, por ora, sobra-me.
Injusto seria se Ele me desse mais, do que necessito,
ou alimentasse caprichos sem nexo,
quando, há quem pouco ou nada possua,
para que sobreviva.
O que desejo
tento que se concretize sem prodígios,
mas com as ferramentas e armas de mim
dignamente,
para que creia na minha existência
e Nele.

Que Deus nos salve

Que monstros sagrados são estes
criados à imagem dos homens,
autoridades das almas de nossos mundos,
que mais contribuem para o desamor
do que para o grande desígnio de um só Eu(s)?

Como pode o homem humanar Deus
em vez de evoluir para o divino?

E Deus está onde impera a Inteligência
e também, se acham os reinos da vida.

E o animal Homem agiganta-se,
mostrando-se como soberano da selva
e o mais petulante dos predadores.

Que Deus nos salve da agnosia,
da intolerância,
do facciosismo
e de todos os males do medo...

O que é o amor

O que é o amor?
Não sei!
Confundo-me por entre instintos
e emoções,
e aprendo a expressar afectos,
sem que entenda os porquês,
condicionado pelos ensinamentos
do mundo que me fica mais próximo.
O que é o amor?
Digam-me!
Se houver quem saiba, que me fale,
para que eu me reveja nele.

Um dia, se vier a reconhecer Deus
talvez consiga experimentar o amor,
se tiver fortuna que em mim se manifeste.

Já vivi tanto

Já vivi tanto
que todos estes anos
me pareceram uma eternidade.
Já hoje, quando me olhei,
não me reconheci.
Estou consideravelmente bem mais maturo
e todos os dias desenham-se-me rugas na alma,
e nascem cabelos brancos no corpo de minha essência...
E dou graças por ter abundância
e perícia para me parturir,
renascido,
sempre que um ciclo expire.

Nunca

Nunca vos acusarei,
por todo o mal que me causastes.
Inventarei um dano menor,
como perdão pelo que já vos azarei,
mesmo que ainda de nada saibamos,
convicto apenas de minha dor,
ou meu drama.

Nem sempre tenho quem me condene,
para que me sirva de escusa à culpa
e salte por cima de meus erros,
sem que os queira acarear.

Felicidade é ser quem sou,
e admiti-lo,
e nunca supor outro caminho,
que não me sirva nos pés.

Estou vivo

Estou vivo de tanta coisa,
que me é difícil morrer de algumas,
mesmo das que já estão mortas
e são prescindíveis.

Será a liberdade uma utopia
ou terei eu o hábito de me prender ao que me iluda
para que me ache livre?

É bem mais fácil ter por perto a infelicidade
e ter o consolo de falar à cerca dela,
do que ter a coragem de desencobrir
o que me possa fazer bem
e habita desde sempre
sem que saiba ainda a minha vera morada.

A minha religião é a vida
e o templo onde oro
é esta esfera de tantas estrelas
que me circunda, desde mim , no centro,
até ao infinito de toda a essência do universo.

Estou vivo de tanta coisa
quando me basta estar bem vivo apenas de mim.

Hoje, perdi-me

Hoje, perdi-me do tempo, contemplando o céu,
atento à dança espontânea dos pássaros,
como se me iludissem de que era eu quem me movia
e chilrearam-me ao coração tamanha alegria
e atravessaram as nuvens já limpas e o arco-íris
e poisaram nos verdes vivos das árvores,
e brilhantes de águas de Abril…
Distraí-me de tudo o que me preocupava
e exigia atenção,
e achei-me em êxtase
enquanto girava o olhar por tão vasto azul
como se me sentisse, também primavera.

Face

Há em mim uma face ardilosa,
a do ego,
de tantos jogos de desejos,
que me é difícil de embair.
Mas a face da consciência dissolvê-la-á,
sem que o ambicione fazer.

E eu apenas vivo a cada momento
trabalhando a persona
à medida da felicidade
de minha contemplação.

Eu

Eu não faço parte de ti,
nem de ninguém,
apenas de teus desejos.
Antes amado
do que desejado,
e harmonia
que variável!

Nem a mim,
por enquanto,
me pertenço inteiro.

Nem sei se alguma vez me serei.

Valho ser gente e feliz

Eu não sou mais do que um espelho teu,
sempre que de mim falares.
E se te gostares, a sério, dirás, incessantemente, o melhor a meu respeito,
mesmo que não mereça.
Mas se porventura não fores capaz de, olhar tão profundamente
para o que te perturba,
e assumir os erros que te pertencem,
desvendar o Eu que te totaliza,
certamente que tudo me arremessarás, por inconsciência,
e serei a mais pura vitima de toda a tua maleficência,
em vez de, pedires ajuda,
e procurares a salvação.

O silêncio pode também ser revelador,
mas é mais difícil de ler.

Quanto mais se nega o que se possa ser
mais se confirma o que se esconde.

Somos todos da mesma espécie, com ligeiras diferenças,
que constantemente se persiste em valorizar,
para que nos possamos parecer, uns com os outros, mais desiguais.

Eu, santo, nunca serei,
tentarei sim desbravar-me, até chegar ao que sou, cá dentro,
sem mais imitar o que exigiram que fosse,
por que valho ser gente e feliz!

Sim ou não

Já não sei,
se não sei o que quero
ou se não quero
o que já sei.
E sim,
pode justificar um ou outro não.
E não,
pode até traduzir o receio de um eterno sim.
E não
pode ser sim,
mas querer-se não.
E o sim faz-se não
mas poderá também voltar a ser afirmação.
E o sim,
quando, é sim, é sim,
até que seja vencido,
por outro sim
ou por que não.

Nada se afirma ou nega
para toda a vida;
sim ou não?

Já não sei
o que é o sim,
e não.

Estrelas que fui

Constam-me ainda tantas partículas
das estrelas que fui,
que todos os dias, me inspiro no Sol
e teimo em brilhar.
E há horas em que consigo,
mas sem que queira
ou dê por isso.
Quando me esforço, apago-me.
Tenho de me esquecer de tudo,
completamente de tudo;
do passado,
do futuro,
me esvaziar de tempo,
e vencer as fronteiras de mim,
para que a luz me rasgue a mente
e eu até consiga sentir o Universo
como estrelas,
todas as que eu fui.

Desperto

Falta-me, agora, tempo,
para ter tempo.
Houve tempos,
em que o tempo era infinito
e eu tinha tempo
para atentamente, viver o momento,
como se o tempo não existisse
e somente eu estivesse totalmente presente
no cosmos de mim,
e vislumbrasse a verdade,
e experimentasse a felicidade, como eterna,
por que a tempo estivera desperto e vivo.

E deverei eu, com tempo,
apagar de vez o tempo
e achar-me no silêncio, acordado
e de vigia
para que seja tudo
e uno.

A minha casa

A minha casa fica num estreito beco,
de uma insignificante cidade
de um pequeno país
do planeta azul
do Sistema Solar
da Via Láctea...

E eu, daqui,
trancado,
do meu exíguo quarto,
como uma diminuta semente,
que julgo conhecer,
guardada numa caixinha de fósforos,
contemplo extasiado o universo, lá fora,
pela única vidraça
que a minha mui humilde habitação possui
e sinto tudo o que avisto, como meu
e tão acolhedor como o leito, onde sossego.

A porta dos fundos
era aberta, somente enquanto dormia,
para que em sonhos caminhasse
pelos mundos profundos de mim.
Perdi-lhe a chave
ou continuo acordado,
sem que queira adormecer,
e sem barulhos na mente...
Agora, é a da frente,
que está escancarada,
para que entre mais luz,
sempre que seja hora,
de ela me querer espreitar.

Eu ser-te-ei

Eu ser-te-ei
sempre que te negares
e contigo fundir-me-ei
se te abrires ao amor,
sem que queiras jamais te ferir.
Olha-te ao espelho
para que só a ti te vejas,
e contempla-te,
mas de mente cerrada.

Tenho

Tenho a responsabilidade
da vida,
perante quem estimulei
a viver.
E a morte,
assim pesa-me deveras,
mesmo que tenha em vistas
renascer.

O tempo marca.
O tempo pode ser ilusão.
E qualquer vida tem tempo
e fim.

Áries

Não queiras ser o melhor,
primeiro,
mas único.

Assume a força da primavera
e marra a vida com pujança,
com os cornos da coragem
sem que nunca te distraias
com o que te ficou para trás.

Áries, de meu primitivo pulsar,
meu primeiro sopro,
meu grito,
meu punhal,
minha carne,
minhas vestes de sangue,
máscara de todas as dores
e universos,
do que me reinvento
e preciso ser!...
E ser,
e ser,
e ser!

Sonho

Voar no canto de uma ave
é sair deste canto do mundo;
depena-se o infortúnio
e lá, bem alto, flutua-se no eterno bem.
Isto é tentar sonhar desperto,
que o outro sonho desconhece,
até que se poise
e a vida anoiteça,
o canto da ave se vá
e reste apenas o pesadelo.

Há quem

Há quem
não consiga,
nunca consiga,
esteja demasiado intoxicado
por tanta coisa,
desde sempre
e lhe reste somente
constatar, com nitidez,
o que lhe é tão real
e (i)mundo.
E assim não mais desperte
para o seu sonho
com o(s) outro(s).
Todos temos liberdade de escolha.
E poderá ser a liberdade a escolhida.
Um dia, naturalmente, dar-me-ão um qualquer salvo-conduto,
para que parta,
sem que magoe demais
quem lute por se limpar, ser puro
e livre.

Não sei se serei capaz!...

terça-feira, 20 de dezembro de 2011

Felicidade

Tristeza
de meu desmedido ego(ísmo).
Alegria
de meu imperecível amor.
Felicidade
no agora,
sem quaisquer lembranças,
Eu e mais Tudo,
Um.

Aprendo a sorrir
de peito aberto para o mundo,
em vez de, em frente ao espelho.

Precisei

Precisei de um pai
e o pai, fui eu,
de uma mãe
e a mãe também fui eu,
quem me amasse,
e nunca houvera vagar
e poucos foram
os que me souberam
transmitir a Verdade
e reconhecer.
Precisei de mim
e nunca lá estive,
cresci depressa demais,
sem que tenha dado conta disso,
por entre tantos
que se fingiram aparentar comigo,
por que não sabia
nunca o que me ser.

E onde moro eu
em minhas crias;
nos que me chamam de pai
e outros que nem conheço?

Hoje, tudo se deseja esquecer,
que o tempo mate,
o que marcou a ferros o corpo e o coração,
quando jamais, se apagará na eternidade,
o que foi, na alma, desde o início, revelado.

As palavras

Não sei se esta liberdade
em breve não esgotará.
Por entre tanto e tudo
o que se diz e escreve
se vai perdendo o que interessa
e não há distância que vença
o mesmo mal de todos;
a mente constantemente emprenhada,
sem espaço à contemplação.
Nem luz que quebre o silêncio,
em que juntos coabitamos,
da mais profunda escuridão.

As palavras são oiro
e delas preciso o que me baste,
para ser um afortunado
e nunca prisioneiro.

Não quero mais que me distraiam;
as palavras também ferem,
as palavras também matam.

Tristeza

Tristeza,
pobreza!
E quanto, também, mais perco,
mais pobre fico.
Mas possuo um enorme sorriso
para o que ainda me resta
e outros para dar,
quando me acham.

Aprendi com o sol
a não me importar com a passagem das nuvens
e a iluminar sempre que posso.

Iluminar

Quanto mais presos estivermos
à gravidade das coisas terrenas,
menos seremos capazes de atingir
a universalidade de Deus.
O Homem divide-se,
em vez de se simplificar,
guerreia e quer vencer,
para se superar nas fraquezas,
e ser herói de amor,
e sentir-se mais uma estrela,
por aqui, no Céu,
também a iluminar,
e enfraquecer a escuridão.

Não (re)conheço a grandeza de Tudo,
mas não me aceito na pequenez!

Aquela criança de dez anos

Por que nunca te foste
se era apenas a ti
que eu pretendia.
Nunca te fujas,
quando o amor lá estiver.
Sê pessoa inteira,
sem receio de receber,
abandono; por também abandonar...
Nada te pertence;
nem mesmo tu,
muito menos eu.
Mas de tanto poderás usufruir.
O tempo acontece,
sem ser preciso contá-lo,
para que tudo seja saboreado sem pressa.
Eu estarei sempre onde for preciso,
desde que também sejas capaz.
Já não quero esperar,
nem viver em ansiedade.
Quero-me muito, demais,
para que combata com armas de outros,
contra inimigos que desconheço,
e manter a esperança,
e encontrar aquela criança de dez anos que perdi;
sei que está viva
e ainda me espera.
Confio agora na sua palavra,
na promessa que me fizera.
Eu é que cresci, sem querer, depressa,
deixei-me levar por o que muitos ambicionam,
para nunca mais me ser,
até me saber melhor
e lembrar-me dela, como nunca.
Ela, sim, sonhava,
e eram grandes os seus sonhos,
nunca me desiludaria por outras verdades,
é demasiado bela,
e continua tal qual como a deixei;
alegre,
e persistentemente crente
e pura!

Amo-a!

Nunca houvera vontade

Nunca houvera vontade
em contrariar a maldade,
de quem fazia crer ser
o que todos os empobrecidos,
mais sonham,
quanto maior é a inveja,
sobre os frágeis que simbolizam ameaça.
Por que do mal lhes advinha, ainda benefícios.
Era cómodo nada alterar
e somente admitir que as vitimas sem posses,
seriam tudo de loucas,
e descontextualizadas, de suas ambições, e estripe,
e das conveniências que une a amizade dos interesses por interesse.

Só os poderosos têm direito à imposição, por orgulho,
defesa de sua honra, a qualquer preço,
os outros, abjectos, mesmo que suas vozes contestem alto,
não passarão jamais de insignificantes asnos,
sem direito a pasto em campo verde.

Nunca haverá vontade
em contrariar a maldade,
desde que o árido ego seja bem pago,
mesmo por um anjo mau,
até pelo diabo.

Fingidor

Escrevo-me
todos os dias,
e passo-me a limpo
para o papel,
quando tenho tempo
para fingir de poeta.

A minha caneta
está esgotada
e sem tinta.

Surdez

Desejo a todo o momento,
que se quebre o silêncio.
Procuro em todos os sons
a cura para a minha surdez.
Louco por nada ouvir,
por nada saber,
crio a melodia da solidão
ao ritmo incerto do tempo,
em acordes de dor e medo.
Difícil será ouvir de novo,
com a mesma vontade.

Ensaio na razão
o barulho que liberte
os recalcados ressentimentos.

Jura

Jura quem em desespero
quer negar a verdade que dói,
com apelos misericordiosos
ao drama dos detalhes, à pena,
para confundir, na importância,
o julgamento maior.
Será julgado pelo remorso,
morrendo no medo de não resistir
à vergonha da descoberta,
acabando por sucumbir
no nó, que em solidão
tanto aperta.

Mente
quem jura!