sexta-feira, 23 de dezembro de 2011

Solidão

Amei-me em ti,
sem o saber de tão grave.
Deixei que me habitasses
sem querer ver teus passos
percorrendo-me habilmente,
por entre o silêncio de meu sonho.
Sentia-te como minha
na verdade que te queria,
no prazer compartilhado,
no apoio consentido...
E achava-te bela e pura
como um pequeno lírio
sumido num campo de muitos verdes.
E eu sempre que podia
te amparava dos ventos,
protegia da chuva,
acariciava como o sol...
E tu dizias-te constantemente perdida
e chamavas por mim
como pássaro ainda no ninho
que espera alimento de sua mãe,
recriavas-me na importância
que imaginava que me desses
e nem respirava
sem que te pensasse,
e nem me via
sem que te pressentisse,
e não te sabia
por que me perdia no medo
que arduamente me trabalhaste.
Tudo parecia correr
conforme me prometera
e não havia mais tempo para nada,
senão escutar-me nas tuas palavras,
e assumir-te nos meus pecados,
e carregar-te aos ombros
quando temias pisar o chão, de cansaço
e te mostravas como criança, diante o pai,
compreender-te pelas noites fora,
quando te apetecia não dormir
e apenas falar de ti.
E contavas-me como te criaras,
e em vez de fadas
consternavas-me com os monstros
que te seguiam desde o berço
e todos os animais
que aniquilaste nos bosques,
que conquistaste,
em noites de qualquer Lua,
nunca por querer,
mas como um anjo obediente,
que cumpre os sacrifícios, os rituais,
solicitados pelo seu Senhor.
Das almas que infernizaste e roubaste
como se justa e fiel, fosses,
aos desígnios de toda a natureza.
E de como te ajustavas
à realidade da sobrevivência,
como se a fragilidade de tua sensibilidade
te personificasse de ingénua.
E sempre que te via eras imaculada...

E queria continuar
esse enamoramento comigo,
convencido de haver felicidade,
algum dia por aqui,
quiçá em outro qualquer lugar,
onde também fosse possível lá estares,
sem de facto, nunca te ter amado.
Mas me preferia assim
mesmo triste e só,
vendido a um desejo qualquer
que te coroava
como se eu fosse rei
e homem...

E quando te quis
não te encontrei
por que nunca assim exististe.
Quando acordei
eras tão pouco
e insignificante,
paupérrima,
e feia como o diabo.

Não há educação,
conhecimento,
e/ou reconstituição
persona ou às entranhas),
que te valham,
nem amor,
nem perdão
que te dêem vida.
Lentamente te matas,
em tudo que mexendo, estragas,
por tão azeda seres,
sem ainda teres apunhalado de vez
o cordão que te prende
ao mais vil e impuro ventre
da puta-mãe que te pariu,
e que nunca confessou
com quem dormiu
para que nascesses.

E tu sim,
és a Solidão,
e ela.

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